House of Cards - 1ª Temporada
Em meados de maio de 2013, Geraldo Alckmin (sim, o PSDBista atual governador de São Paulo), disse estas sábias palavras: O povo não...

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Em meados de maio de 2013, Geraldo Alckmin (sim, o PSDBista
atual governador de São Paulo), disse estas sábias palavras:
O povo não sabe de um décimo do que se passa contra ele
próprio. Se não, ia faltar guilhotina para a Bastilha, para cortar a cabeça de
tanta gente que explora esse sofrido povo brasileiro.
Tirando o tom de “bom coração” que Alckmin quer expressar
com essa frase, e que a gente desconfia que ele não tenha, vamos combinar que
ela não passa da mais pura verdade. Você consegue imaginar como deve ser o dia
a dia dos nossos políticos? Como eles realmente trabalham naquele ambiente de
troca constante de favores? Onde está a linha que separa, de fato, a
honestidade da corrupção? O que diferencia um favor “aceitável” de um favor “corrupto”?
A série não mostra um político qualquer em seu dia a dia.
Mostra um homem extremamente rancoroso, extremamente vingativo, extremamente
soberbo. Em algumas situações ele chega a parecer um personagem de novela,
tamanhas as intrigas e tramoias que ele
apronta. Não basta colocar um contra o outro, ele ainda faz questão de pedir “segredo”
da fofoca para dar continuidade ao seu plano, num ato que muito se assemelha ao
que vemos há milhares de anos nas novelas da Globo.
Mas isso não tira o mérito de House. Esta é sua premissa, e
ela a executa muito bem. Reclamo do excesso “novelístico” da trama porque já
vi outras duas séries políticas que me pareceram mais... realistas: The
West Wing e Political Animals. Enquanto Political Animals era mais humana, The West Wing primava pela inteligência. E que inteligência. Em suas sete temporadas vi tantas discussões e
termos políticos, que em algum lugar da minha mente devo ter aprendido algo de
política americana. Os personagens realmente discutiam e faziam política. Houve
alguma tramoia aqui e ali, mas na maior parte do tempo se via inteligência,
idealismo e (o que parece ser) o cotidiano dos representantes do povo.
O presidente de West Wing, por exemplo, era um político autêntico
que de fato sabia o que acontecia ao seu redor. Mais do que isso, ele
controlava a parte do seu mundo que ele conseguia e podia controlar (“podia” no
sentido de “poder saber”), e ele mesmo já chegou a ser um “dano” a ser “tratado”,
ao contrário do que vemos aqui. É interessante notar que tanto House of Cards
como Scandal, duas séries políticas atuais, mostram seus respectivos
presidentes da república como fracos, manipuláveis, meros fantoches dos que
realmente orquestram o poder atrás das cortinas.
Talvez esta seja uma tendência. Não sei. Talvez seja esta a
realidade. Eu não saberia dizer. Mas me causa certo estranhamento. Aquele que
está no topo não deveria ser, por natureza, o mais esperto? Afinal, ele não
teve que passar por cima de todo mundo pra chegar lá?
Todavia, o universo de House of Cards ainda conseguiu fazer
sentido para mim. Não duvido por um minuto que aquele tipo de ambiente sujo e
podre da política realmente exista, e que muitos Francis povoem o poder. Na verdade,
o nosso poder. Não acabamos de ler o que um deles acabou de dizer? Que faltaria
guilhotina caso soubéssemos o UM DÉCIMO de como somos tratados?
Por mais que os políticos ao redor de Francis soem um tanto
inverossímeis (afinal, TODO MUNDO realmente compraria a “persuasão” dele
assim?), ele, com toda a sua arrogância, é totalmente palpável. Ele é
inteligente, mas se acha mais inteligente do que realmente é. E os estragos que
ele causa, por mais planejados que sejam, são muito grandes e possuem muitas
pontas soltas (como por exemplo, o PT que achou que nunca seria pego pela farra do mensalão). Se ele realmente fosse tão inteligente quanto acha, teria que
pensar em formas de se expor menos, como no caso de acabar indo para a cama com
a jornalista Zoe Barnes (Kate Mara).
Na verdade é muito engraçado ele ter pensado que controlaria
a moça por este meio. Por mais “sedutor” e “manipulador” que ele seja, nenhuma
dessas correntes permanecem para sempre. E, no final das contas, ela é uma
jornalista. Independente da existência dele. Então o que exatamente ele pensou
que ganharia dormindo com ela? Controle? Por quanto tempo? E depois que este
controle acabasse? Ele achou que ela continuaria sendo “fiel”? Por favor. Ele deu o queijo e o prato pra ela. É claro que ela vai se fartar da refeição.
Uma coisa que apreciei demais foi sua esposa, Claire
Underwood (Robin Wright). O casamento deles é um arranjo político onde NADA é inválido. Seus
casos amorosos e crimes mais tórridos não são segredos. Não existe pedido de
perdão nem perdão entre eles. É, de fato, o Ultimate Marriage. Como é que pode
haver erros quando nada é um erro, afinal?
Bem, House of Cards também foi rápida em responder isso. Por
mais Bonnie & Clyde que sejam, Francis e Claire têm um grande problema:
Francis. As regras do jogo deles pode até estar bem claras, mas em certo ponto
ele automaticamente começa a jogar apenas em favor de si próprio. Mesmo que ele
possa, e mesmo que ele tenha a total liberdade de incluir a esposa em seus
planos diabólicos, ele acaba escolhendo o caminho onde ele é o rei e ela é nada
mais do que uma peça descartável. Besta. O único que perde é ele.
Claire é sua mais fiel e poderosa aliada. Prova disso é que
quando ela não se alia a ele, os projetos dele vão por água abaixo. Porque
há um simples ponto que "cola" toda a estrutura de Francis: Claire. Ela é parte
vital de seu “projeto de poder”. Inevitavelmente, em cada passo que ele deu,
ele teve que pedir a ajuda dela. E conforme a temporada foi passando e ela não era correspondida, e ele continuava a pedir favores sem demonstrar a
devida gratidão, ela foi ficando alienada e percebendo que, por
mais que ela seja o ponto comum, tudo era sobre Francis. Para ele e por ele.
Outra coisa peculiar na série é ela colocar essa “determinação”
do protagonista tão grande a ponto de ele cometer um assassinato. Novamente,
outra questão em comum com Scandal e, até onde eu penso, uma semelhança não
muito digna de se orgulhar. Onde que os escritores pretendem chegar com tal
ideia? Que essa ambição ultrapassa os limites da sanidade? Que, independente do
tamanho do crime, os políticos sempre terão um jeito de sair ilesos? Que o
caminho da série é levar o protagonista “à sombra da máfia”? (Vide o sangue nas mãos de Francis nos pôsteres de divulgação).
De qualquer forma, a Netflix já confirmou a estreia da segunda
temporada de House of Cards para 14 de fevereiro de 2014. Logo saberemos se
Frank foi mesmo nomeado Vice-Presidente, ou se o Presidente teve que novamente
retirar sua promessa -- e desta vez por algo bem maior do que o mero conselho
de seu braço direito. Saberemos também como este casamento de rocha sobreviverá
à avalanche que está por vir, representada por uma confusa Zoe Barnes e sua
mais nova melhor amiga, que mal sabe no que está se metendo, Janine Skorsky (Constance Zimmer). Saberemos se a inteligência
de Francis Underwood é mesmo tão magnífica quanto ele pensa, e o que ele fará
para sair do buraco que cavou para si com tanto esmero.
House of Cards foi muito elogiada. Kevin Spacey foi indicado ao Globo de Ouro de melhor ator. Muito se ouviu
de elogios também à Netflix, que abriu horizontes ao fazer um drama de tamanha
qualidade fora da plataforma televisiva. Contudo, aos meus olhos, House of Cards
não é nenhuma The West Wing. Ela tem seus méritos, sua premissa, suas virtudes. E numa época de tanto lixo na televisão, ela é, obviamente, PURO
LUXO.
Mas não é um achado nem uma grande descoberta. É um drama
cuja trama já foi (melhor) explorada. E que ainda tem muito a provar.
P.S.: Link da matéria da Folha de São Paulo falando sobre o comentário do Alckmin: www1.folha.uol.com.br/poder/2013/05/1275598-faltaria-guilhotina-se-o-povo-soubesse-o-que-se-passa-diz-alckmin.shtml
P.S.: Link da matéria da Folha de São Paulo falando sobre o comentário do Alckmin: www1.folha.uol.com.br/poder/2013/05/1275598-faltaria-guilhotina-se-o-povo-soubesse-o-que-se-passa-diz-alckmin.shtml